(M)Eu, Verso

Da realidade ao poema, estas são histórias inspiradoras que deram forma ao verso.

Menopausa Precoce
A história real de Margarida

“Há mulheres que entram em menopausa precoce naturalmente. A minha foi provocada pelos tratamentos”

Quem a vê chegar, não fica indiferente à sua luz. Sorridente, enérgica, de uma alegria contagiante. O colorido da roupa parece transmitir o estado de espírito, que nos envolve, numa espécie de aura reluzente. Tem um espírito jovem, embora o corpo lhe tenha pregado algumas partidas.

Margarida nunca foi “muito regular”. Teve o período, pela primeira vez, aos 15 anos - “mais tarde do que o normal”, na sua opinião. Tomou “sempre” a pílula, exceto quando tentou engravidar. E, da primeira vez, foi difícil: “Tive de fazer tratamentos de fertilidade para ficar à espera da minha primeira filha. Mas não cheguei a fazer inseminação artificial”. Depois, na segunda vez, teve mais facilidade em engravidar do que imaginava: “Na primeira gravidez, fui seguida na Estefania. E depois, na segunda filha, já tinha mandado o meu processo para a Estefânia outra vez para começar a ser seguida, mas fiquei à espera de bebé sem fazer nada, naturalmente. Foi engraçado porque, na segunda gravidez, tudo se resolveu. Mas nunca fui uma pessoa muito certinha, muito regular. Se não tomasse a pílula, podia ter o período de dois em dois meses ou de três em três”, conta.

Margarida
“Quem a vê chegar, não fica indiferente à sua luz. Sorridente, enérgica, de uma alegria contagiante.”
“Quem a vê chegar, não fica indiferente à sua luz. Sorridente, enérgica, de uma alegria contagiante.”

Quando a menopausa surgiu, tinha 42 anos e as filhas 15 e 7. Margarida tinha tido o período duas semanas antes e, inesperadamente, voltou a ter “hemorragias”. Tinha acabado de saber que tinha cancro de mama e, preocupada, contactou o médico ginecologista que a tinha observado, no dia anterior: “Não era normal estar com uma hemorragia naquela altura. Por isso, às tantas, tudo me passava pela cabeça: desde o cancro não estar só no peito, estar também nos ovários… Se calhar, o médico não viu bem… Mas ele disse: ‘Não, Margarida, é só o seu corpo a reagir, é normalíssimo’. A reagir à notícia, tipo traumático”, explica. Mas Margarida estava enraizada no seu otimismo e refutava os argumentos do médico: “Mas eu não estou traumatizada com nada, quer dizer, estou aflita. Claro que vou fazer uma biópsia, mas isto ainda não é nada. Ele: ‘Não, Margarida, é. Você tem um cancro e a biópsia vai determinar que tipo de cancro é e que tipo de tratamento vai ter de fazer’. E eu: ‘Mas é cancro mesmo? Não há mesmo hipótese de não ser cancro?’ E ele: ‘Não, Margarida, é cancro.’”.

Mas eu não estou traumatizada com nada, quer dizer, estou aflita. Claro que vou fazer uma biópsia, mas isto ainda não é nada.

Foi diagnosticada em novembro de 2019 e, em dezembro, começou a fazer tratamento. Deixou de tomar a pílula, por recomendação do médico, mas não voltou a ter qualquer hemorragia. Só tomou consciência que tinha entrado na menopausa quando não voltou a ter o período: “O médico avisou-me que podia não voltar ou que, durante os tratamentos, possivelmente, não ia ter. Há muitas mulheres que entram em menopausa precoce naturalmente. A minha foi provocada pelos tratamentos”, explica. “Quando acabei a quimioterapia, tive logo que começar a tomar o Tamoxifeno, que é um tratamento hormonal, que induz a menopausa porque o meu cancro era hormonal. Portanto, nunca mais tive nada”, continua.

No entanto, durante os tratamentos, os sintomas misturavam-se: “Aqueles calores de que as mulheres se queixam durante a menopausa, as alterações de temperatura repentinas… eu tive-as misturadas com os sintomas da quimioterapia. [Os sintomas da menopausa] Não passaram despercebidos, mas passaram diluídos com os sintomas da quimioterapia”, afirma.

“O meu médico diz uma coisa muito engraçada que é: ‘A função faz o órgão’.”
“O meu médico diz uma coisa muito engraçada que é: ‘A função faz o órgão’.”

Apesar disso, Margarida assegura que a menopausa “teve impacto”: “Eu sou casada e, porque estava doente, a minha prioridade não era ter relações com o meu marido, não é? No entanto, [a menopausa] muda a vontade, muda a disposição, e fisicamente também se muda. E eu senti isso. É lógico que não me apercebi logo de tudo, porque eu estava com o cancro e as coisas estavam muito misturadas… Mas, depois, fui fazendo um esforço para continuar a minha relação não tão esporádica com o meu marido. O meu médico diz uma coisa muito engraçada que é: ‘A função faz o órgão’. E, a partir do momento em que não se usa o órgão, ele deixa de fazer sentido. Portanto, mesmo as mulheres na menopausa, se têm marido, companheiro, namorado, o que seja, e se deixam de ter vida sexual, cada vez se torna mais difícil. Porque custa, porque dói, porque … tudo e mais alguma coisa”, justifica. Psicologicamente, não sente que a menopausa a tenha afetado porque “o foco era tratar a doença e ficar cá mais uns anos”. E, apesar de admitir que “gostava de ter tido mais filhos”, “aos 42 anos já não era uma prioridade”.

“Psicologicamente, não sinto que a menopausa me tenha afetado porque o foco era tratar a doença e ficar cá mais uns anos.”
“Psicologicamente, não sinto que a menopausa me tenha afetado porque o foco era tratar a doença e ficar cá mais uns anos.”

Hoje em dia, não tolera calor e já andou “de leque”: “Às vezes, quando bebo um copo de vinho, já cheguei a ter aqueles calores nas pálpebras e no bigode, tipo a suar de sítios que nem se sei de onde é que vem… Agora já não ando de leque, mas, se estão acima de 30 graus começo a desfalecer com o calor”.

Atualmente, tem 47 anos e, além de ter enfrentado um cancro da mama, em 2019, foi-lhe diagnosticada uma leucemia, em 2022. Apesar de garantir que tem consultas com o ginecologista todos os anos, fez “um intervalo de dois anos por causa da leucemia” até porque estava “a ser seguida no IPO”.

Às vezes, falar com os médicos e ignorar um bocadinho o tabu, não ter medo de falar sobre o assunto, é bom porque ficamos a saber coisas que desconhecíamos.


No entanto, há cerca de dois meses, já com os problemas de saúde resolvidos, voltou ao médico, para uma consulta de rotina, e sentiu necessidade de esclarecer dúvidas sobre temas que nunca tinham sido abordados: “Durante os tratamentos deste segundo cancro, a menopausa, o período, as relações sexuais, as securas, a falta de hormonas, também não foram uma prioridade nem para os médicos nem para mim. Portanto, agora quando voltei ao médico, disse-lhe que me custava horrores ter relações sexuais e ele receitou-me testosterona e mais um gel para hidratar… Às vezes, falar com os médicos e ignorar um bocadinho o tabu, não ter medo de falar sobre o assunto, é bom porque ficamos a saber coisas que desconhecíamos. Nunca falei com ninguém sobre o assunto, também porque ainda não tenho ainda amigas a passar por esta fase e há coisas que as amigas não conseguem dar a resposta, como os médicos dão, não é?”.